STF valida artigo do Código de Trânsito que considera crime fuga de local
- Clarissa Prestes
- 16 de nov. de 2018
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Atualizado: 22 de set. de 2020

Em sessão na quarta-feira (14), o Supremo Tribunal Federal formou maioria e tornou válido artigo do Código de Trânsito Brasileiro (CTB) que prevê a detenção de seis meses a um ano ao condutor que deixa o local do acidente "para fugir à responsabilidade penal ou civil que lhe possa ser atribuída". O dispositivo contraria questionamentos de um motorista do Rio Grande do Sul que alegou que ninguém está obrigado a produzir prova contra si mesmo.
Para o relator, ministro Luiz Fux, a fuga do local do acidente é "absolutamente indefensável". Na avaliação dele, descriminalizar a conduta vai contra a vontade do parlamento. "A Constituição promete, em nome do povo, uma sociedade justa e solidária. Como que se pode criar uma sociedade justa e solidária admitindo a conduta de quem se afasta do local do acidente para fugir da responsabilidade penal e civil? É absolutamente impossível que uma ordem jurídica não imponha a criminalização desta conduta."
Já o ministro Alexandre de Moraes afirmou que há uma "verdadeira epidemia" de acidentes de trânsito no país e que o artigo 305 tem por objetivo obrigar que o condutor envolvido no acidente permaneça no local para que autoridades possam apurar o ocorrido. "O fato de o artigo 305 estabelecer uma vedação ao condutor do veículo de se afastar do local do acidente não o obriga ao ficar a ter que confessar uma responsabilidade, ou a ter que abrir mão de seu direito ao silêncio, não obriga a ter de participar de uma reconstituição imediata, a realizar exames obrigatórios. Eles têm a obrigação, como condutores de veículos, de resguardar local dos fatos e aguardar a apuração." Moraes lembrou que estudos técnicos mostram que a partir da preservação do local do acidente e da análise deste local para apurar o que aconteceu, a prevenção se torna mais fácil.
A ministra Rosa Weber destacou que o artigo 305 do CTB não ofende a Constituição Federal e que “a exigência de permanência do condutor no local do acidente permite sua identificação, facilita a responsabilização penal e civil e apresenta-se como importante fator de solidariedade a incrementar a proteção à vida e integridade física da vida".
A ministra Cármen Lúcia, por sua vez, entendeu não ser possível considerar inválido o dispositivo por afronta a princípios fundamentais. "Não considero ter havido aqui afronta ao princípio da proporcionalidade e excesso do legislador em face da garantia constitucional que permanece hígida e considerando o princípio da responsabilidade que é de todo cidadão em relação aos outros porque não dá para como se deixar de entender o direito como instrumento de acatamento ao princípio da responsabilidade que é própria da convivência social”. O ministro Edson Fachin, por sua vez, destacou em seu voto que, em 1981, o Brasil passou a adotar regras estabelecidas por uma convenção de trânsito celebrada em Viena, que trata, entre outros pontos, sobre o comportamento do motorista em caso de acidente: "Como o Brasil internalizou-a, portanto, é lei no Direito interno a ser considerada para a solução dos casos submetidos à prestação jurisdicional", frisou Fachin.
Já o ministro Luís Roberto Barroso defendeu a existência de um direito penal moderado, mas ressaltou que, "no atual estágio da condição humana, o comportamento ético precisa de um incentivo normativo". "Eu não me animo a retirar do Código Penal uma norma que acho que dá o incentivo correto às pessoas pararem para socorrer ou permitir a reconstrução do fato, assegurado o direito de permanecer em silêncio para não se auto incriminarem". Barroso disse ainda que considera o dispositivo compatível com a Constituição, porque fugir após atropelar, causar acidente ou ser parte de um acidente não são condutas compatíveis com o ideal constitucional de uma sociedade justa e solidária.
A constitucionalidade do crime de fuga do local de acidente foi debatida em um recurso extraordinário de relatoria do ministro Luiz Fux, que teve repercussão geral reconhecida, por unanimidade, o que significa que o entendimento firmado pelo STF nesta sessão deverá balizar casos similares.